Política remuneratória dos militares: pacto de gerações ou crise de gerações?
- Subtenente Gonzaga
- 23 de out. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 14 de mar.
As coisas são boas ou ruins por comparação. E o resultado da comparação sempre dependerá dos elementos comparados e de quem está comparando. E este é meu ponto de partida.
Na conjuntura em que vivemos, é necessário reconhecer que:
• A base da pirâmide hierárquica está com remuneração de valor insuficiente para garantir a necessária dignidade de habitação e alimentação;
• Os salários de todos estão defasados pela inflação;
• Há um alto índice de endividamento;
• Um governo que tem obsessão pela supressão de direitos;
• A compressão pelo o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal;
• O limite de despesa da PEC 109;
• A ameaça do governo Zema com a retirada de direitos pela Reforma Administrativa;
• A insistência do Zema para implementar o Regime de Recuperação Fiscal;
• O sistema de saúde ameaçado pela redução da alíquota patronal;
• O aumento da alíquota de contribuição dos militares para a saúde e pensão;
• O Zema que não move uma palha para a adoção do PROPAG, em substituição à recuperação fiscal;
• Entre outros fatores.
Em contraponto, um percentual significativo de militares só ingressou na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais quando já havia sido consolidado o modelo atual de carreira; política remuneratória; legislação disciplinar sem a pena de prisão; carga horária; direito de locomoção (lembra que os militares só podiam se ausentar do município onde eram lotados com autorização de superior, que na maioria das vezes não autorizava?); terceiro grau; carreira jurídica para os oficiais; e outros importantes avanços.
Muitos lembram corretamente do ADE como fator de comprometimento da paridade e temos a obrigação de considerar esta realidade.
Quando o Aécio enfiou goela a baixo o ADE, ele o fez exatamente para que todos fossem para a Reserva com os proventos correspondentes à remuneração básica.
E ouvi de muitos que aquilo somente iria atingir os “próximos que viessem”. “O nosso está garantido”. E eu disse por várias vezes: “Vamos trabalhar para incorporar o ADE na remuneração. Não podemos deixar para trás os companheiros que ainda vão chegar, pois daqui a 15 ou 20 anos eles vão cuidar de nós.
E nós precisaremos deles para não nos deixar à mingua na Reserva. Fato é que conseguimos incorporar. Há ainda o que melhorar na ADE para que a integralidade e paridade sejam reais para todos.
Nesse sentido, deve-se admitir mais um ciclo de avaliação e implementar uma espécie de gatilho para recuperar os vencimentos daqueles que por alguma razão não obtiveram 100 de avaliação em um período.
Neste caldeirão, é natural que possamos ter percepções diferentes sobre a mesma realidade e, por consequência, apontemos caminhos distintos.
Para todos que ingressaram na Polícia Militar antes do ano 2000, é esperado que possam ter conclusões diferentes dos que entraram depois. É compreensível. É também natural que as agruras do passado não incomodem a quem não as vivenciou.
Posso afirmar, no entanto, que nestes trinta e poucos anos em que estou nesta caminhada, participando diretamente do processo reivindicatório e das mesas de negociações, nunca faltou entre os negociadores institucionais e de classe a mais profunda preocupação com o pacto de gerações que fez sustentar o mínimo de compromisso solidário.
O mais velho cuida do mais novo e até daquele que ainda vai chegar. O mais novo cuida do mais velho e não o deixa à margem.
Nunca foi unanimidade, mas sempre foi a maioria. Tenho a satisfação de ter ombreado inúmeras vezes com dezenas de companheiros nas associações e na política, dezenas de comandantes, para somar esforços e melhorar as condições para todos.
E agora o pacto de gerações está dando lugar a uma crise de gerações? Vamos repactuar em outras bases? Com outros fundamentos?
Pessoalmente, prefiro entender que é mais um momento em que a realidade nos cobra coragem, coerência e ousadia. Ousadia para defender o conjunto da classe. Coragem para participar, dialogar e defender a todos. Mais do que nunca, a classe cobra que sejamos classe.
É natural que a cobrança dos mais novos, em algum momento, possa não considerar a luta dos mais velhos. Não me revolto. Compreendo, muito embora possa não concordar! E, naquilo que não concordo, sinto-me no direito de provocar reflexões e tentar construir consensos sem, no entanto, perder a capacidade de defender a todos.
É preciso unir forças para enfrentar o mesmo alvo: o governador do Estado.
Neste contexto, reafirmo a minha defesa da Política Remuneratória que contempla a paridade e a integralidade, baseadas nos fundamentos constitucionais e nos parâmetros da Lei Delegada 43/2000.
Em mais de 30 anos de participação direta na formulação de propostas e de estratégias de reivindicação e negociação, tenho a satisfação de nunca ter admitido que alguém ficasse para trás.
Pela conjuntura política da Reforma da Previdência enfrentei, no plano federal, talvez a mais desafiadora das lutas. E com satisfação mantivemos na Constituição Federal o direito à integralidade e paridade entre ativos, veteranos e pensionistas, o direito à reserva compulsória por tempo de serviço, promoção ao posto/Graduação quando da transferência para a Reserva e o direito à proteção social com o caráter não contributivo para os proventos da inatividade.
É verdade que fui vencido em duas teses: 35 anos e aumento da alíquota de pensão. Fui vencido, mas não defendi e sequer concordei.
Minha coerência me impõe manter a defesa da integralidade e paridade conquistadas na Constituição Federal e na Lei Delegada 43/2000. Quem sempre quis quebrar a paridade foram governadores, com destaque para o Zema.
O direito à integralidade e paridade ficou, constitucionalmente, preservado exclusivamente para os militares, mas parte de nossa classe parece querer ou não se importar em jogar fora essa conquista.
Para as categorias que na Constituição já perderam o direito à integralidade e paridade e, portanto, aposentam pelo teto, ter ou não penduricalhos não é preocupação de médio e longo prazo. Só para os militares isto faz sentido.
Tenho insistido em afirmar o óbvio: é sonho de todo governador retirar parte do salário e transformá-lo em parcela indenizatória ou em vantagens não incorporáveis. Isso é muito econômico para o Estado, mas deletério aos militares.
Não sei se no futuro poderemos comemorar, mas no passado, nos últimos 27 anos, houve convergência entre representações políticas, de classe e comando, que defenderam a integralidade e paridade, mesmo quando houve forte pressão.
O momento é de muito diálogo, de busca por unidade e projeção de cenários para identificar as melhores opções.
Com tudo que vivi e por tudo que lutei, dialoguei e defendi, entro neste processo — agora em que há comissões formais para analisar as propostas de bico legal e etapa alimentação — defendendo minha convicção de que a manutenção das bases da política atual é a melhor opção para o médio e longo prazo.
Vou defender, como política de médio prazo, e não como estratégia de interditar o debate, que possamos rever o escalonamento vertical, elevando a base sem perder os fundamentos da Lei Delegada 43/2000. É possível construir e defender uma proposta em que seja reconhecida a necessidade de elevar o valor da base remuneratória, num jogo de ganha-ganha.
Convido você a refletir sobre isto também!
Vamos à luta. Sem luta não há conquista!
Subtenente Gonzaga